28
Acordarmos cedo, afinal tínhamos uma viagem de 3 horas para fazer e queríamos chegar à hora de almoço. Sentia o descontentamento dele, sabia perfeitamente o quanto ele queria poder jogar em Aveiro, mas não ia ser possível, e alem disso ele não deveria fazer esforços sequer, para poder estar apto para o próximo jogo de sexta-feira.
Chegamos a Aveiro mesmo ao meio dia e seguimos directamente para casa dos meus avós, onde se ia dar o jantar de família. Ia ser uma espécie de surpresa para todos, pois eles não sabiam que eu levava o Pablo comigo. Alias, a ideia da surpresa tinha sido dele, e eu só poderia esperar que corresse bem. Apesar de eu saber que eles não iam aceitar a ideia à primeira.
Ele sorriu para mim, eu retribuí o sorriso e seguimos para a entrada da casa.
Mal abri a porta, foi soltado um amontoado de palavras como “a nossa menina”; “Jane”; “voltaste!”; e assim quando as expressões acabaram e antes que alguém pudesse correr para mim para abraços e afectos, movi-me para o lado deixando o Pablo, exposto aos olhares de todos.
-Oh céus, é o Pablo Aimar… - chutou a minha madrinha, incrédula, que de adepta ferrenha tinha tudo e sabia perfeitamente quem ele era.
-Hola. – ele saudou.
-O Jogador do Benfica? – perguntou o meu avô, e mesmo sem resposta percebeu que era, pelo ar incrédulo de todos.
Eu acho que se no momento pudesse, tinha-me enfiado num buraco… A minha família teve uma típica reacção de “epá olha o papa!” E eu sabia o quanto o Pablo era susceptível e tímido com essas reacções.
Eles cumprimentavam-no finalmente, depois de eu explicar que ele percebia português, e lá me demonstraram os seus afectos do costume.
Ah excepção da minha madrinha que tentava espreitar para lá para fora para ver se vinha mais alguém connosco.
Ri-me. – Que foi? Estas à espera que apareça aí o resto do plantel é? – perguntei brincando com a situação.
-Não… Não… - disse disfarçando. – Mas isso era um motivo de muito orgulho… Mas diz-nos lá o que faz aqui o Pablo Aimar… Quer dizer… tudo bem que trabalhas para o glorioso Jane, mas nunca pensei que conhecesses os Jogadores, minha querida sobrinha.
Olhei-o. Ele estava quieto, e o desconforto misturado com a timidez estavam estampados na sua face.
-O Pablo é meu namorado! – disse directamente. Não ia andar com voltinhas sobre o assunto.
E de novo o olhar perplexo e incrédulo voltou as suas faces. Todos pareceram aceitar bem, ainda que com um certo choque de impacto, mas a minha madrinha sabia o que os outros todos naquela sala não sabiam. Ela sabia que ele era casado, e que tinha filhos e provavelmente estaria a perguntar-se que raio se passava ali.
Olhei-a como que a pedir que se mantivesse calada e assim ela fez… Apesar de tudo sempre tínhamos sido muito amigas e cúmplices, por isso ela confiava em mim.
Tivemos um almoço bastante alegre, apesar das imensas perguntas da minha curiosa família, tais como. “Porque é que ele não ia jogar?” “Como nos conhecemos?” “O que se andava a passar com o Benfica?” Enfim… E o Pablo lá foi perdendo a timidez e explicou algumas coisas, se bem que a maior parte das vezes eu tinha que o traduzir porque apenas eu e a minha madrinha percebíamos espanhol.
Depois do almoço, os homens decidiram ir até ao café que ficava do outro lado da rua, e o Pablo decidiu ir com eles. Afinal convívio não fazia mal a ninguém. E por mim ele fazia parte da família.
Mal eles saíram começou a chuva de perguntas.
-Jane, explica-me o que me está a escapar se faz favor! – exigiu a minha madrinha.
-Não há nada para explicar…
-Não? Como não? Vá lá eu sei perfeitamente que o Pablo alem de ter mais uma década que tu em cima, é casado e tem filhos… Como é que ele pode ser teu namorado?
E mal estas palavras saíram da sua boca, a minha mãe e avó olharam directamente para mim, como que à espera de uma boa resposta.
-A idade nunca foi um problema nesta casa, porque é que tem de ser agora? Eu tenho 20 anos, sou maior e vacinada e ele tem 31, já não é uma criança! – disse directamente sem olhar nos olhos de nenhuma delas. Eu já esperava por este momento desde que tinha deixado Lisboa. E sinceramente acho que ninguém tinha que se meter na minha vida e nas minhas decisões, só tinham que aceitar.
-Isso não está em causa! – disparou a minha mãe. E quase obrigando-me a olhar para ela, levantou a voz para dizer – Casado? Filhos? Estavas com a cabeça a onde?
-Qual é o vosso problema? – estava a ficar farta daquela situação. – Sempre me apoiaram em tudo, apoiem agora. Aceitem-no! Sim ele tem filhos, 3 maravilhosas crianças, que o amam e que me adoram. E não ele já não é casado. É divorciado, e antes que se ponham aí com suposições e mexericos, que fique bem esclarecido que não fui eu que destrui o casamento dele. Quando o conheci já estava destruído à muito tempo. Qual é o problema? Nos amamo-nos! Apenas isso importa!
As três olharam para mim, mais serenas mas ainda com a desaprovação estampada nos rostos, e nesse mesmo momento os homens voltaram, e acho que o ambiente pesado se fez sentir.
E como se fosse a coisa mais normal do mundo, ele sentou-se ao meu lado, envolveu os seus braços a volta da minha cintura, puxou-me para o seu colo, deu-me um leve beijo na bochecha e pronunciou num tom normal e em que todos ouviram um –Te amo. – que fez um sorriso aparecer no rosto do meu pai e avô e um vestígio de possível aprovação no rosto da minha madrinha, mãe e avó.
Respirei fundo. –Eu e o Pablo temos que ir!
-Tão cedo filha? Eu sei que a viagem é longa, mas pensei que fossem só logo. – disse o meu pai já preparando-se para se despedir do Pablo.
-Sim. Nós vamos ver o jogo ao estádio. Depois voltamos para Lisboa.
-Cuidado com a condução, filha. – avisou.
-Eu sei pai!
E dito isto despedi-me deles sem muitas lamechices, ainda que me custasse, admitir que ia sair dali para os ver sabesse lá quando, com um ar pesado.
Ambos saímos, entramos no carro, respirei fundo e segui viagem. Os primeiros 5 minutos foram invadidos pelo silêncio. Mas eu sabia que o silêncio não ia durar.
-¿Que paso, antes de llegarnos del café? – perguntou-me quebrando o silencio e desviando o olhar da paisagem para mim,
Desviei o olhar da estrada por segundos para o encarar, mas tão rapidamente como o fiz, voltei a encarar a estrada.
-Nadie, solo que las mujeres de mi familia… A ellas le gusta meterse en la vida del los otros e a mi no me gusta eso. – disse-lhe serenamente.
-La culpa eres mía, yo lo sé. – disse-me directamente.
Eu estava a odiar ter esta conversa ao volante. Mas ele tinha começado e eu queria que acabasse ali.
-No… no eres. Mi familia es que no les gusta la idea de yo amar un hombre divorciado e con hijos, pero yo no quiero saber, elles van acabar por lo aceitar, lo que realmente importa eres que yo te amo, e no preciso que ninguén lo aceite, solamente tú. - desabafei ainda que faltasse a coragem para o enfrentar depois do que tinha dito.
Senti a sua mão sobre a minha perna, o que me fez estremecer. –Yo lo entendo… Solamente no quiero que te quedes triste con tu familia por mi culpa. – disse acariciando-me a perna.
-No te preocupes Pablo… Elles van a ceder, y yo… yo te amo justamente de lo jeto que tu eres. – disse-lhe soltando um sorriso ao qual ele retribuiu.
E assim seguimos serenamente para a cidade de Aveiro, ainda tínhamos tempo para visitar a cidade antes do jogo.
(…)
O jogo tinha corrido bem, tínhamos ganho 3-1 o que nos garantia o 2º lugar, isolado, na liga. O Saviola tinha voltado aos golos assim como o Cardozo e por momentos pensei que estava de regresso à época passada e tive a sensação de que estava tudo bem. Apertei com força a mão do Aimar, em muitos momentos do jogo. Eu sabia que ele queria estar a fazer parte daquilo, mas que não podia.
Mas o que importava no final, era a vitoria, era termos mostrado que estávamos a lutar por estar li, e que íamos lutar até ao fim. E até o ambiente entre jogadores e treinador pareciam óptimos. Foi reconfortante ver dez jogadores irem festejar os golos todos juntos, só faltava o Roberto, que limitava-se a festejar sozinho, a agradecer a deus e a guardar a sua baliza com unhas e dentes.
Depois de uma vitória que nos deu alento, fizemos a viajem de regresso a Lisboa, mas não, sem antes passarmos pelas instalações do estádio para felicitar os jogadores.
Pela primeira vez esta época senti que as coisas se estavam a recompor, só esperava que se mantivessem no topo e não começassem a desmoronar outra vez.
Mais uma vez obrigado a todas as pessoas que me apoiam e que gostam da minha fic. Obrigado, do fundo do coração.